terça-feira, 11 de agosto de 2015

Peça de Philippe Minyana inédita no Brasil estreia com direção de Francisco Medeiros

Gustavo, Laís, Amanda e Carlos - foto de Flavio Barollo
O tempo e as memórias da vida permeiam toda a obra 
que conjuga humor e anarquia, sensibilidade e ironia.

O espetáculo ​Do Amor​ ­ texto contemporâneo e inédito no Brasil do dramaturgo francês Philippe Minyana ­ estreia no ​dia 3 de setembro​, quinta-­feira, na Oficina Cultural Oswald de Andrade​, às 20 horas, com direção de Francisco Medeiros​. A tradução é assinada por Amanda Banffy​. A Oficina pertence à Secretaria de Estado da Cultura, sendo gerenciada pela Organização Social Poiesis (Instituto de Apoio à Cultura, à Língua e à Literatura).

Com extrema sensibilidade, o autor mostra a passagem do tempo na vida de dois casais, desde a juventude até o fim da vida, destilando nas entrelinhas uma ironia ferina, temperando tudo com um humor mordaz e impiedoso. Os acontecimentos ordinários da vida, como amor, envelhecimento e morte, são questões fundamentais à obra. Os personagens Christina, Bob, Ted e Mylène são figuras mutantes, múltiplas, contraditórias. Não há caracterizações físicas e a interpretação é revezada pelos casais de atores ​Amanda Banffy ​e ​Carlos Baldim​, Gustavo Duque ​e​ Laís Marques​.

O diretor argumenta que Minyana faz uma espécie de arqueologia da memória. “Ele escreve como se fizesse escavações; retira elementos da memória e os combina de forma não linear para compor uma figura não homogênea”. A disposição desses elementos, de forma fragmentada e pouco nítida, propõe um novo encaixe para essa figura de lembranças. “Minyana nos apresenta uma visão de mundo ilegível, com linhas borradas aos olhos cotidianos”.

Do Amor conduz o espectador pela vida dos dois casais: em sua sala, nas montanhas, no verão, com os amigos, nas adversidades, aos 30 ou 70 anos. Ora eles têm um ar sério e empolado como pessoas em luto, ora são adoráveis velhinhos. É possível observar suas vidas sem glórias pelos ritos inevitáveis como ​funerais, reuniões, aniversários. Suas vidas comuns se tornam uma espécie de epopeia, mistério secular, onde o amor é consolo ou derrota ou mesmo uma idéia que os assombra. A memória funciona como intuição de futuro, leitura presente e registro passado. A arquitetura do texto aponta também para uma memória que pode ser construída de imaginação, sob o ponto de vista alegórico que emerge da experiência de estar vivo. As cenas enigmáticas podem ser fragmentos de sonho, delírio, pesadelo ou divagação.

A linguagem dramatúrgica de Philippe Minyana em Do Amor explora a palavra cotidiana e a transforma em teatro épico. A banalidade da ficção e do discurso é reforçada por um dispositivo textual original. Além do texto dos atores, as rubricas descritivas e poéticas (sobre tempo, silêncio, pássaros) são ditas por um comentarista, chamado Voz Off, e as rubricas narrativas por outro, denominado Texto. Faladas por todos os atores, em revezamento, essa rubricas divagam sobre a atitude dos personagens contradizendo-os ou se reportando ao interlocutor. Esses diálogos polifônicos criam discrepâncias, oposições e rupturas particularmente ricas e fantasiosas.

Segundo Francisco Medeiros, Minyana é um experimentador. “​Do Amor Foi escrito sem pontuação para que os atores possam também experimentar a pontuação, a pulsação do texto, e descobrir sua musicalidade, seu ritmo”. Ele ainda explica que o processo de montagem é pleno desafio na busca por uma linguagem cênica nova e autêntica para esta obra.

A cenografia (​Heron Medeiros​), a iluminação (​Igor Sane​), o figurino (​Marichilene Artisevskis​) e a trilha sonora (​Dr. Morris​) têm papel fundamental na encenação de Francisco Medeiros, sendo agentes de configuração que, magicamente, expõem as diversas dimensões e profundidades que a peça aborda. O diretor acata o desafio da obra de Minyana que propõe uma estética enigmática, uma plasticidade que explora o espaço e flerta com as artes visuais. O cenário é calcado em uma caixa retangular, com uma espécie de ciclorama ao fundo e espelhamentos na frente e nas laterais. A cenografia se presta às imagens sugeridas pelo texto que passam por texturas turvas ou cristalinas, transparências ou reflexos, duplicações e nebulosidades.

Para o diretor, ​Do Amor não é uma peça para, necessariamente, ser compreendida ­ com começo, meio e fim. “Os estilos épico, dramático e lírico são combinados de forma anárquica tanto nos fatos quanto na estrutura. A encenação, portanto, precisa fazer com que esta anarquia esteja presente com todo o seu rigor”. Convidado pela atriz e produtora Amanda Banffy para dirigir o espetáculo, Francisco Medeiros confessa que foi movido pelo desafio. Após ler o texto declarou: “Não sei o que isto significa. Não entendo, por isso quero fazer”.


Ficha técnica

Espetáculo: ​Do Amor
Texto: Philippe Minyana
Tradução: Amanda Banffy
Direção: Francisco Medeiros
Elenco: Amanda Ban​ffy, Carlos Baldi​m​, Gustavo Duque e Laís Marques
Assistente de direção e preparação corporal: Fabricio Licursi
Cenografia e adereços: Heron Medeiros
Trilha Sonora: Dr Morris
Figurino: Marichilene Artisevskis
Iluminação: Igor Sane
Direção de produção e administração: Maurício Inafre
Assistência de produção: Mya Morales
Fotos: Flavio Barollo
Assessoria de imprensa: Verbena Comunicação
Realização: Cacildinha Produções
Co-realização: Banffy Produções Artísticas

Serviço

Estreia: dia 3 de setembro. Quinta­feira, às 20 horas
Oficina Cultural Oswald de Andrade (Teatro)
Rua Três Rios, 363 ­ Bom Retiro/SP. Te: (11) 3221­5558
Temporada: quintas, sextas e sábados, às 20 horas – Até 24/10
Ingressos: Grátis – Os ingressos devem ser retirados 2h antes das sessões.
Duração: 80 min. Gênero: Comédia dramática anárquica. Classificação: 14 anos
Capacidade: 40 lugares. Ar Condicionado. Não possui acessibilidade. 

Philippe Minyana​ ­ autor

Nascido em 1946, em Besançon, o francês Philippe Minyana (Philippe Miñana) escreveu cerca de 40 peças de teatro, publicadas pela Éditions Théâtrales e L’Arche Éditeur e montadas na França, Alemanha, Inglaterra, India, Argentina, Brasil e Quebec. Alguns textos foram lidos numa rádio francesa nos programas Nouveau Répertoire Dramatique e Radios Drames. E alguns ganharam versões para a televisão, como ​Chambres, dirigido por Bernard Sobel (1986), e ​Anne­Mariepor Jérôme Descamps (2001), entre outros. Escreveu o roteiro do telefilme ​Papa Est Monté au Ciel, dirigido por Jacques Renard. E em 2008, junto a Comédie Française, criou a peça ​La Petite Dans la Forêt Profonde.

Após ganhar o Grande Prêmio de Teatro (2010) ​da ​Académie Françaisepelo conjunto da obra, Minyana foi convidado a apresentar seus cinco textos mais recentes, agrupados sob o título ​Les epopées de l’intime, no Théâtre des Abbesses e no Théâtre Ouvert, em Paris. Dentre as cinco peças estava ​Do Amor, que teve sua estreia em março de 2011. Além de ser um autor premiado, dois textos seus ­ ​Chambres e ​Inventaires ­ são leituras obrigatórias no Bacharelado em Artes Cênicas na França. Entretanto, poucos textos seus foram encenados aqui no Brasil, onde o autor ainda permanece pouco conhecido, não havendo nem mesmo tradução para o português da maior parte de sua obra.

Além do Grande Prêmio de Teatro, recebeu o Prêmio SACD para ​Inventaires, Prêmio Molière de Melhor Autor (1988 e 2006) e Prêmio da Crítica Musical e Molière (1991) de Melhor Espetáculo Musical para ​Jojo. Para muitos, sua obra sofre certa influencia do dramaturgo e encenador Michel Vinaver, com quem trabalhou como ator. O dramaturgo – que não esconde a sua fascinação pelas artes visuais (cinema, artes plásticas, fotografia) – também assume que a sua escritura teatral será sempre um laboratório. Fatos cotidianos contidos em recortes de jornais ou depoimentos de pessoas são matérias­primas para seu trabalho. No Brasil, poucos textos seus foram encenados, a exemplo de André (direção de Christiane Jatahy), ​Inventários – O Que Eu Guardei Pra Você ​(Grupo Cena, direção de Guilherme Reis), ​Suíte 1(Cia. Brasileira de Teatro, direção de Marcio Abreu).

Francisco Medeiros ​­ diretor

Francisco Medeiros nasceu em São Paulo, 1948. Formado em Direção Teatral, Crítica e Dramaturgia pela ECA­USP, é diretor de espetáculos de teatro, dança e ópera. Iniciou a carreira em 1973 e dirigiu mais de 100 espetáculos, entre eles: ​Fando e Lis, de Fernando Arrabal, ​Artaud, O Espírito do Teatro, de José Rubens Siqueira, ​Réquiem, de Hanoch Levin e ​Facas nas Galinhas, de David Harrower.

Desde 1999, é diretor artístico do Núcleo Argonautas de Teatro, que já desenvolveu dois projetos selecionados pela Lei de Fomento ao Teatro: ​O Que Morreu, Mas Não Deitou e
Terra Sem Lei.

Além de teatro, sua atuação na área da dança como diretor inclui trabalhos com o Grupo Cisne Negro (​Iribiri), com Antonio Nóbrega (​O Reino do Meio­Dia), entre outros. Em ópera, no Teatro Municipal de São Paulo, dirigiu ​Eugène Oneguin,de Tchaikowski, com regência do maestro Isaac Karabtchevsky.

Recebeu 40 prêmios, como Molière, Mambembe, Inacen, APCA, Apetesp, Governador do Estado, Coca­Cola Femsa, Panamco, além de 12 indicações para o Prêmio Shell de Teatro como Melhor Diretor ou na Categoria Especial. Destaque para o prêmio Internacional Angel Award, pelo espetáculo ​Flor de Obsessão,do Grupo Pia Fraus, considerado o melhor espetáculo de teatro físico do Festival Internacional de Edimburgo, em 1999.

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