quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Texto inédito de Sebastian Barry estreia na Verniz Galeria com direção de Darson Ribeiro

Foto de Eliana Souza
A violência contra a mulher é o mote do projeto idealizado por Darson Ribeiro, que traduziu e apresenta pela primeira vez no Brasil o autor Sebastian Barry, inglês radicado na Irlanda.

O espetáculo inédito no Brasil O Orgulho da Rua Parnell, do dramaturgo inglês Sebastian Barry, estreia no dia 14 de janeiro (sábado, às 20h) na Verniz Galeria com direção de Darson Ribeiro.

A peça é uma compilação de monólogos interconectados, nos quais um casal – interpretado por Alexandre Tigano e Claudiane Carvalho - relata minuciosamente o resultado caótico de uma relação de amor que foi ceifada por um ato medonho de violência por parte do marido. A encenação - que tem ainda participação especial do garoto Enrico Bezerra (de nove anos) com intérprete de uma canção - utiliza a ambientação natural da galeria como cenário e plateia (o público senta-se nos próprios móveis do antiquário, que também podem ser adquiridos).

O Orgulho da Rua Parnell narra 10 anos dessa complicada e também bela história de amor. Em movimentos delicados – quase paralisados – as personagens descrevem entre lágrimas, risos, tesão e orgulho tudo o que os levou à situação atual. São lembranças pesadas e até insanas, mas permeadas de um amor sem igual. A peça revela o grau de perigo, quase sempre perniciosamente velado, que existe na paixão e o estrago que isso pode provocar, caso esse sentimento seja sublimado ou potencializado em substituição às vontades próprias, fazendo do egoísmo uma arma fatal.

Na obra de Barry as limitações e o controle das emoções vêm no formato de prosa, ao mesmo tempo áspera e macia. Joe Brady é um ladrãozinho insignificante que tem o apelido de “homem-meio-dia”. Ele e sua esposa Janet vivem na periferia de Dublin, na Irlanda, e apesar da vida marginalizada mantêm orgulho de seu lifestyle, como ocorre com a maioria das personagens de Sebastian Barry.

No enredo, a derrota que marcou a desmoralizante desclassificação da Irlanda na Copa do Mundo de 1990, na Itália, cobrou seu preço. E parece que para o casal Joe e Janet a cobrança veio com juros altíssimos. O déficit desses dois foi maior do que o da seleção naquela noite. Alguns anos se passaram e agora eles revelam a intimidade de um amor eterno, mas também a ruptura desastrosa do casamento.

É um início de relação pobre, mas feliz. Ela, mãe aos 16 anos, sofre para criar os três filhos. Ele, apelidado de “midday man”, vive à sombra e água fresca, roubando carros. Eles vão se aturando até que o primogênito Billy morre atropelado por um caminhão de cerveja. Este é talvez o início do fim, não só da relação, mas até mesmo do amor pela Irlanda. Será? Ao voltar para casa, após a quarta de final dos jogos, Joe quase mata a esposa, espancando-a. Desfacelada, ela foge para um abrigo de mulheres, levando as crianças. Apesar da ausência do marido - e pai - ela vai reconstruindo sua vida, enquanto ele se afunda na heroína, nas prisões e sofre com a AIDS.

Segundo o diretor Darson Ribeiro, “O Orgulho Da Rua Parnell se encaixa perfeitamente no contexto teórico e estético de montagens realizadas por ele, como a recente Os Guarda-Chuvas, que discutia a degradação da família culminada com a morte da esposa e mãe, interpretada por Maria Fernanda Cândido”. Ele argumenta que a peça de Barry traz a simplicidade como aliada, respeitando o não naturalismo indicado pelo autor, principalmente na relação interpretativa dos atores. E a direção, então, se apropria da precisão para contar essa trágica história de amor, brincando com o imagético e criando camadas no arquétipo das personagens. “A história é narrada como se ‘esfregássemos’ as situações na cara do espectador. E tudo isso em meio ao acervo da Verniz, uma Galeria que garimpa e recupera mobiliário industrial, localizada no Centro velho de São Paulo, hoje point entre os  descolados”.

Sobre o tema “violência contra a mulher”, o diretor ressalta os altos índices e o número de prisões e de mortes que vêm aumentando em vários países, incluindo o Brasil, culminando no dilaceramento familiar. “A sociedade dá pouca atenção para o fato. O teatro tem a função de alertá-la. Desta forma, o Conselho Estadual de Defesa da Mulher, por meio de sua Presidente Rosmary Correa foi o primeiro a credenciar esse projeto”, comenta Darson.

“Vivemos numa época em que cada vez mais o homem, ainda que inconscientemente, vem tentando contar com seus sentidos. É nesse estado que ele, paradoxalmente, provoca em si atitudes que ultrapassam limites da consciência. Só depois, já com o ato consumado, é que busca a qualquer custo se livrar das armadilhas de seu próprio desejo. Assim, empenha-se desmedidamente em valorizar o que era simples, belo e eficaz: o viver... Quase numa espécie de sublimação. Por esse motivo escolhi a Galeria Verniz - um antiquário que tem a delicadeza de misturar objetos com a força de peças e mobiliário industrial, que vai de encontro à ‘cenografia desmantelada’, e ao mesmo tempo aconchegante, do casal protagonista. As pessoas entram e se sentam em pequenos lounges com poltronas e mesas em ambientes íntimos, podendo inclusive comprar não só as peças onde estão sentadas, mas obras de arte, relíquias, sofás, tapeçarias e vasos.” Finaliza o diretor.

Sebastian Barry e O Orgulho da Rua Parnell

Depois de ter sido interrogado sobre a razão pela qual ainda não tinha escrito uma peça tendo como tema a violência contra a mulher, Barry alegou que vinha insatisfeito com textos sem embocadura para os atores. Mas, no final de 2004, atendendo ao pedido do diretor artístico do Dublin Fishamble Theatre Company, Jim Culleton, trouxe ao papel as lembranças da Copa de 1990, quando vivia em Dublin, na Irlanda, mais particularmente na Rua Parnell. Segundo a pesquisa do autor, após as partidas de futebol, principalmente as derrotadas, os maridos ainda sob uma espécie de “euforia futebolística” chegavam em casa e espancavam violentamente suas esposas. Estas mulheres superlotavam os abrigos femininos.

Assim, com o texto, Barry tenta encontrar a razão de tamanha violência, que ainda impera nos dias de hoje, valendo citar os altos índices do Brasil. Com ou sem futebol. Em 2006, numa de suas aulas de teatro, a inspiração para aprimorar o texto veio com veemência. E, assim, iniciou uma série de trocas de emails com Culleton, o primeiro diretor da peça, retomando “o quão verdadeiro e preciso – ao mesmo tempo misterioso – o teatro pode ser”. Ele completa: “quando você vai ao teatro e vê uma peça qualquer, ainda que simples sobre pais e filhos, ela vai te fazer avaliar o que a vida é de fato, e o quão curta ela é”. Em 2007, com a resposta positiva do público e da crítica no Festival de Teatro de Dublin, Sebastian Barry teve a certeza de que The Pride Of Parnell Street o havia reconectado definitivamente com o palco.

Ficha técnica / serviço

Texto: Sebastian Barry
Direção, tradução, Trilha, cenografia e figurino: Darson Ribeiro
Elenco: Alexandre Tigano (Joe) e Claudiane Carvalho como (Janet)
Participação especial: Enrico Bezerra
Iluminação: Rodrigo Souza
Iluminotécnica: LPL Lighting Designer
Consultoria técnica: Capitão Marcelo Nogueira
Edição/trilha: Lalá Moreira DJ
Design gráfico: Iago Sartini
Fotografia: Eliana Souza
Assessoria de imprensa: Eliane Verbena
Suporte de movimento: Gustavo Torres
Assistente de direção 1: Arnaldo D’Avila
Assistente de direção 2: Camila Carneiro
Auxiliar de produção: Eli Barcellos
  
Espetáculo: O Orgulho da Rua Parnell
Local: Verniz Galeria
Rua Álvaro de Carvalho, 318. Centro/SP
Temporada: 14 de janeiro a 20 de fevereiro de 2017
Horários: sábados e segundas (às 20h) e domingos (às 19h)
Ingressos: R$ 60,00 (meia: 30,00)
Bilheteria: 1h antes das sessões (aceita cheque e dinheiro). Reservas: (11) 97655-3687
Classificação: 12 anos. Duração: 75 minutos. Gênero: drama. Capacidade: 50 lugares.

Perfis

Darson Ribeiro - Formado em Artes Cênicas pela PUC/Fundação Teatro Guairá do Paraná, tem especialização em direção, cenografia, figurino e produção. Passou pelos dois mais importantes teatros do país, o Municipal de SP e do RJ, nas funções de Diretor Técnico, de Cena, de Produção e Operacional. Trabalhou com todos os mais importantes diretores brasileiros e alguns internacionais, valendo citar Bob Wilson, Pina Bausch e Strehler, e Jorge Takla, Gabriel Vilella, e Ulysses Cruz – de quem foi assistente por anos. Foi o principal consultor para a obra do Teatro Bradesco, onde realizou a abertura com um memorável evento unindo Bibi Ferreira, Ana Botafogo, artistas convidados num show com Café De Los Maestros e Marisa Monte. Lá, permaneceu como diretor artístico por dois anos e meio. Fundador e diretor da Dr. Darson Ribeiro Produçõs, seus trabalhos não se resumem somente no ator, mas em cenografia e figurino, além de produção e direção, como em alguns deles: 8Mulheres, suspense cômico de Robert Thomas, dirigindo Miriam Pires e  Ruth de Souza; Oberosterreich, de Franz Kroetz, tendo parceria com Ney Matogrosso, pelo Goethe RJ e Consulado da Áustria; Maratona, de Naum Alves de Souza; Boeing Boeing, de Marc Camoletti, sucesso também no Rio com Heloisa Perisse e temporada em SP com Mônica Martelli e Cássio Scapin; A Prova, com Andréa Beltrão; O Mundo É Um Moinho, de Fauzi Arap, com Caio Blat, Claudio Cavalcanti e Maria Ribeiro; A Bofetada, com a Cia Baiana de Patifaria; O Mistério do Fantasma Apavorado, de Walcyr Carrasco; Ballet Kirov e Bolshoi, Stomp, Orquestra de Berlin e outras. Com As Mentiras Que os Homens Contam, de Veríssimo, em cartaz por quatro anos incluindo temporada em Portugal. Como ator, foi vencedor do Troféu Gralha Azul de Melhor Ator pelo espetáculo Tu & Eu, de Friedrich Wachter, em Curitiba-PR, além de se destacar em peças como O Eucalipto e os Porcos, texto e direção do argentino Hugo Mengarelli; Bodas De Sangue, de Garcia Lorca, e Senhora dos Afogados de Nelson Rodrigues. No Rio, atuou na montagem de La Ronde, dirigida por Marcus Alvisi. Foi destaque na mídia nacional pela reinauguração do Teatro Glória do RJ, onde por iniciativa própria o reformou e reinaugurou-o com Paulo Autran, que lhe rendeu uma homenagem em cena aberta. Na TV, novelas como Torre de Babel, Malhação, Kubanacan e A Favorita (Rede Globo), Jamais Te Esquecerei, Corações Feridos e Cúmplices de um Resgate (SBT) e Prova de Amor (Record). Sangue Na Barbearia, um de seus mais importantes trabalhos, reuniu dois autores argentinos e convidou Antonio Petrin para contracenar e, de novo, em parceria com Ney Matogrosso, inaugurou o Auditório do SESC Pinheiros. É o responsável pela vinda anual da Cia Armazém de Teatro para SP, para a qual realizou recente temporada no SESC Bom Retiro com Inútil A Chuva. Realizou por dois anos, entre temporadas e festivais, Disney Killer, texto de Philip Ridley que traduziu, produziu, dirigiu e protagonizou, com destaque pela crítica nacional, incluindo Bárbara Heliodora. Foi o responsável pelo projeto Logos-Dialogos (Sesc SP), unindo Bach (executado ao vivo pelo cello barroco Dimos Goudaroulis) e dança contemporânea (Déborah Colker, Ismael Ivo, Luis Arrieta e outros). Homens No Divã, sua comédia que discute o homem na psicanálise, permaneceu três anos em cartaz com mais de 250 mil espectadores. Em outubro de 2015 estreou Os Guarda-Chuvas, adaptado e dirigido por ele do original de Luccas Papp. Recentemente, a convite da Royal Caribbean, coordenou por um mês as atividades culturais do navio Independence of the Seas, que incluíram concertos de piano, o musical Greese, shows e o Jam Rock Reggae Cruise com participação dos filhos de Bob Marley.

Alexandre Tigano - Além de ator formado pela Escola Macunaíma, é Bacharel em Educação Física. Entre os espetáculos teatrais de que participou destacam-se: Disney Killer, de Philip Ridley, e Um Cruel, de Rafa Ramos, ambos dirigidos por Darson Ribeiro; Macaco Peludo, de Eugéne O‘Neil com direção de André Garolli; O Beijo no Asfalto, de Nelson Rodrigues com direção de Sérgio Ferrara; Macbeth, de Shakespeare com direção de Zé Henrique de Paula; Eleutheria, de Becket com direção de Ariel Moshe; Outsiders, de Tennessee Williams, com direção de Simone Sallas. Participou também do processo de montagem de Oresteia-O Canto do Bode (Grupo Folias D`Arte), e do processo de criação da peça Timão de Atenas, de Renato Borghi. Estudou A Gestualidade na Cena Contemporânea, com Tiche Vianna e Ésio Magalhães; Universos Arrabalescos, com Reginaldo Nascimento, e Corpos e Gestuais, pelo Folias com Renata Zhanetta. Atualmente, integra o Grupo de Estudos do TAPA. No cinema, atuou em: Magal e as Formigas, de Newton Cannito; Mundo Cão, de Marcos Jorge; Crô, de Bruno Barreto; Colegas (Vencedor do Festival de Gramado em 2012) e Rinha, dirigidos por Marcelo Galvão; Quer Saber?, de Paulo de Tarso Disca; e Tríade, de Amilcar Claro. Cursou ainda Interpretação para cinema com Fátima Toledo. Na TV, participou das novelas A Favorita e Tititi (Rede Globo) e A Terra Prometida (Rede Record).

Claudiane Carvalho - É atriz formada pelo Centro de Pesquisa Teatral - CPT, coordenado por Antunes Filho e é bailarina (balé clássico, flamenco e pole dance). Foi indicada ao prêmio de Melhor Atriz no Festival de Teatro Catarinense por Amor por Anexins, de Artur Azevedo. Atuou em peças como: Amor por Anexins; Seis Personagens à Procura de um Autor; O Defunto; A Casa de Bernarda Alba; Luar sobre o Caribe; Fogo Cruel em Lua-de-Mel; Perfídia Quase Perfeita; Neny Hotel Inn; Romeu e Julieta; Sussurros (Mostra de Teatro Contemporâneo SESI/SP); Solilóquios de Shakespeare; e Questão de Direito. Integrou o elenco da web série Mulheres de Cássia, sob direção de Hermano Leitão, do curta Dúdú e o Lápis de Cor, de Miguel Rodrigues, e do longa Do lado de Fora, de Alexandre Carvalho. Atuou nas novelas Amor e Revolução, Carrossel e Chiquititas, todas no SBT. Graduada em Letras pela USP (Espanhol e Tupi) e Univille (Português) e pós-graduada em Ciências Humanas – Língua Portuguesa e Teatro Brasileiro – pelo Instituto Internacional de Ciências Sociais. É também Maquiadora profissional e Instrutora de Yoga. Atualmente, leciona Literatura Brasileira, Gramática e Redação no Ensino Médio da rede particular de ensino. Estudou interpretação para TV na Escola Wolf Maya, além de participar de workshops com o Grupo TAPA e diretores como Luiz Antonio Rocha, Luciano Sabino, Ignácio Coqueiro, Roberto Lage, Francisco Medeiros, Celso Nunes e Jair Assunção. É formada em canto popular pela Escola de Música e Tecnologia e integrou o Grupo de Pesquisa em Cinema AP 43, de Nara Sakarê e o Núcleo Criativo de TV e Cinema de Miguel Rodrigues.

Verniz Galeria 


Verniz é o nome do novo projeto de Paulo Bega, Fábio Matheiski e Luciano Tartalia, um galpão com 400m2, localizado na estreita Rua Álvaro de Carvalho, 318, no centro de São Paulo. Verniz reúne “achados” decorativos vindos de pesquisas dos sócios em lugares como família vende tudo, depósitos, leilões, bazares, feiras e beiras de estradas. Fora do circuito de garimpo de móveis e objetos de decoração da cidade, com peças requintadas a objetos de uso industrial, o acervo exposto no galpão é rotativo e não tem restrição de estilo. A Verniz oferece, principalmente a profissionais da área de decoração, serviço de curadoria de garimpo a portas fechadas, com horário marcado. As peças expostas, encontradas em lugares improváveis, podem ser restauradas, reutilizadas ou recriadas. Os móveis e objetos de decoração também são alugados para cenografia. No extenso espaço do galpão é possível observar o contraste entre as peças industriais inacabadas e a conservação dos detalhes em objetos de valor histórico. As peças restauradas já estão disponíveis para compra imediata, entre elas, uma farmácia da década de 40. Sob o olhar dos sócios, algumas peças ganham novas formas de uso. Por entre estantes repletas de pequenos objetos, mesas de madeira diversas, luminárias de ferro e grandes poltronas é possível encontrar peças - que normalmente possuem forma tradicional de uso - instaladas de maneira subversiva, como molas de um colchão antigo penduradas na parede. A essência da Verniz, em suas recriações, passa pela exploração,  de diferentes possibilidades de intervenções no contexto natural dos objetos.

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